quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Crônica sobre Sensação Térmica

Texto de Dante Mendonça - Parana Online
Dica: Marcelo Brauer


Sensação térmica




O astrônomo sueco Anders Celsius deve estar se revirando no túmulo e a causa não é a temperatura do inverno europeu. É que o grau Celsius já não vale mais nada. Foi jogada no lixo a escala de temperatura concebida de forma com que o congelamento da água fosse de valor zero e o ponto de ebulição correspondesse a 100.

Sensacional, no Rio de Janeiro não se fala em outra coisa:

- Quantos graus centígrados diz o termômetro?

- 40 graus, mas o aparelho já está fora de linha. Preciso comprar um atualizado, que diga a sensação térmica.

Bons tempos aqueles, quando o Rio era de 40 graus. Hoje, com 50 graus de sensação térmica, a moça do tempo agora assim nos informa: “O tempo continua abafado no Paraná, com boas chances de chuva a partir da tarde. A condição atmosférica favorece possíveis temporais. As temperaturas serão altas em todo o estado, acima dos 30.´C, com a sensação térmica de 35.´C.”

Os tempos mudaram, o aquecimento global mudou o discurso dos ambientalistas, o filme de Nélson Pereira dos Santos vai ter que acrescentar um subtítulo ao nome (Rio 40 graus, com sensação térmica de 50) e nem mesmo vai sobreviver aquela velha polêmica a respeito de onde é mais frio, se em Porto Alegre ou Curitiba?

Num inverno desses, o curitibano viajou a Porto Alegre. Em Curitiba o termômetro do aeroporto Afonso Pena marcava zero grau. Ao chegar, o termômetro do aeroporto Salgado Filho indicava 5 graus. No caminho do hotel, ao comentar que em Curitiba estava bem mais frio, o curitibano precisou ouvir do motorista de táxi:

- Mas bá, tchê! Cinco graus em Porto Alegre é muito mais frio que zero grau em Curitiba!

A galhofa perdeu o sentido porque os gaúchos podem argumentar em favor do taxista, e com toda a razão, que com cinco graus o vento à beira do Guaíba leva a sensação térmica abaixo de zero.

Anders Celsius nunca iria imaginar, mas a nova escala de temperatura está tão na moda que até em Florianópolis os costumes mudaram.

Era hábito dos manezinhos marcarem encontro para tomar a cervejinha gelada depois que passasse o ônibus para Paulo Lopes, município da Região Metropolitana mais ao sul. Veio de uma das figuras folclóricas da ilha, boêmio que tinha como pretexto para levar os amigos ao bar o forte argumento de que o ônibus para Paulo Lopes já havia passado.

- Vamos tomar uma geladinha?

- É muito cedo.

- Como assim, cedo? Ora, cedo... se até o ônibus para Paulo Lopes já passou?

E assim ficou. Virou uma senha. Em pleno expediente na repartição, quando o manezinho sentia a mão tremer por uma loura gelada, pedia ao chefe para se retirar:

- Com licença, mas preciso pegar o ônibus para Paulo Lopes.

E quando ficava até mais tarde no boteco, a mulher o buscava com uma ordem irrecorrível:

- Ô estepor! Para casa que o ônibus de Paulo Lopes já foi e voltou duas vezes!

Hoje a ilha não é mais a mesma. Não mudou de água para vinho, mudou de água para champanhe. Basta ver o desfile de paulistas endinheirados no Jurerê Internacional. Ninguém mais fica de olho no ônibus para Paulo Lopes:

- Vamos tomar uma?

- É muito cedo!

- Cedo? Com essa sensação térmica nunca é cedo para tomar uma gelada!

Essa nova aferição de temperatura deve ser mais um dos efeitos do aquecimento global, fazendo ferver os miolos dos modernos “produtores de conteúdo” em busca da “realidade virtual”. Podem apostar, dentro em breve os personagens dos novos romances de terror não vão mais sentir um “frio na barriga”.

- Ai! Senti uma baixa sensação térmica na barriga!

No rádio, o repórter policial conta as últimas:

- Uma pequena colisão fez o tempo esquentar na Rua Silva Jardim. Mas a sensação térmica entre os dois motoristas era muito maior.

Das notícias que nos chegam do Haiti, até agora só não nos responderam uma pergunta mórbida:

- Afinal, qual é a sensação térmica do inferno?

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Kilimanjaro sem neve

Kilimanjaro sem neve

4/11/2009

Agência FAPESP – Ernest Hemingway, Ava Gardner e Gregory Peck perderam a vez para as mudanças climáticas globais. Se fosse hoje, As neves do Kilimanjaro, conto escrito em 1936 pelo autor norte-americano que virou um dos maiores sucessos de bilheteria nos cinemas em 1952, teria, no mínimo, que mudar o título.

O motivo é que as famosas neves no maior monte da África, com 5,8 mil metros, que sempre pareceram eternas, estão desaparecendo. Segundo um estudo que será publicado esta semana no site e em breve na edição impressa da Proceedings of the National Academy of Sciences, o gelo no topo poderá desaparecer completamente nas próximas duas décadas.

Lonnie Thompson, da Universidade do Estado de Ohio, nos Estados Unidos, e colegas apontam que as temperaturas mais elevadas, em conjunto com as condições mais secas e com menos nuvens, estão contribuindo para a sublimação e o derretimento do gelo no alto da montanha na Tanzânia.

Os pesquisadores combinaram medidas da área congelada obtidas a partir de fotografias aéreas com dados sobre alterações na espessura do manto para determinar em que velocidade o gelo está sumindo.

Segundo eles, a área total coberta pelo gelo encolheu cerca de 85% entre 1912 e 2007. Se as condições climáticas atuais persistirem, o gelo poderá desaparecer em 2022 ou, no melhor dos cenários, em 2033.

Os autores do estudo destacam que embora as neves do Kilimanjaro tenham sobrevivido por 11.700 anos, incluindo secas históricas e alterações climáticas, sem ações de mitigação eficazes as condições atuais poderão não apenas eliminar o gelo na montanha, mas também promover um significativo impacto na vida das comunidades locais na África.

Na figura abaixo, a imagem da esquerda é de junho de 2001 e a da esquerda é de julho de 2009.



Fonte: Agência FAPESP e civilianism.com